Em um país onde cerca de 87% se
declara cristão, é muito comum ouvir palavras divinas nas bocas dos políticos.
O grande problema é encontrar o cristo nos corações deles. Isto vale até mesmo
para a bancada evangélica, onde há inúmeros políticos sendo investigados por
corrupção e alguns até já foram presos. No senso do IBGE de 2010, cerca de 22% se
declarou evangélico. Considerando o crescimento de 1,14% ao ano, média de
crescimento, este seguimento representaria hoje mais de 30%. São cerca de 62
milhões de pessoas. Havemos de convir que este número deva chamar bastante
atenção dos políticos.
Dentre este número crescente de
evangélicos, muitos viraram massa de manobra nas mãos de ávidos candidatos. Já
algumas igrejas mais ousadas lançaram os seus próprios candidatos. E isto tem
chamado muito atenção do governo e dos magistrados, tanto que “a pouco mais de
um mês das eleições, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) abre o debate sobre uma
possível punição de candidatos que se utilizam de espaços religiosos para
campanhas políticas”[i].
Eu não entendi bem esta questão
do TSE. A igreja, acima de tudo, é um grupo de pessoas, trata-se da sociedade
civil organizada. Ainda que eticamente eu concorde com o TSE, no fato de que a igreja não
deveria tornar-se um curral eleitoral, eu discordo que deva ser proibido por
lei. Baseio-me na teoria de que qualquer grupo, seja este: religioso,
esportivo, cultural, técnico, ou qualquer outro aglomerado, é constituído por
pessoas politizadas, e elas tem o direito de dizer o que quiserem em suas reuniões,
desde que não fira a Constituição.
Na busca de abocanhar votos entre
os cristãos, até mesmos os mais boçais entre os candidatos, fala a respeito de
Deus. Chega ser engraçado ver o jeito totalmente desengonçado, de algumas destas
figuras ao falar sobre Deus. Eu estava presente em uma reunião, onde um político
afirmou que ele era um católico protestante. Foi uma gargalhada só! Mas, pasme
os senhores, ele não entendeu porque as pessoas riram. O presidente da camara teve que interromper e dizer: "peraí meu amigo, ou você é católico ou protestante, os dois não há como". É ridículo, convenhamos.
Mas, político que se presa, comete muitos ridículos para ganhar uma eleição.
Eles vão a terreiros, igrejas, bares, e nas ruas beijam os pobres, sobem morros, vão
às favelas.. em fim, eles entram em qualquer buraco onde possam arrancar ou
comprar votos.
Há um completo desespero dos
partidos de esquerda, amplamente esboçado em suas críticas contra as igrejas.
Embora haja igrejas defensoras de partidos de esquerda, fundamentadas na
teologia da libertação, difundida no Brasil pelo Frei Leonardo Boff, elas são
em pequeno número. Nem mesmo a Igreja Católica que foi tão forte em apoiar
movimentos de esquerda, em suas pastorais, parece estar tão engajada. Em parte
pela decepção causada pelo crescimento da corrupção na era PT, e também pelo
avanço da libertinagem sexual tão amplamente defendida por militantes. Candidatos
de esquerda como Ciro Gomes, em suas falas, criticou fortemente o engajamento
das igrejas na política. Em parte ele está certo, porque de fato a coisa é
real, mas por outro lado, é querer colocar tudo em um balaio de gatos. O que demonstra
o seu desconhecimento deste outro universo que é o mudo gospel brasileiro.
O que parece que não ficou claro
para os esquerdistas, que se demonstram tão sábios em seus discursos, é que não
existe uma homogeneidade evangélica. Entrar no mundo gospel e tentar entendê-lo
é como ir a outro continente, sem conhecer a língua e a cultura daquele lugar,
e depois querer esboçar uma opinião. Este conglomerado de 30% não tem um líder,
uma cabeça, não falam o mesmo idioma, e tem alguns até que se odeiam. A única
coisa que muitos têm em comum é que eles falam que vivem segundo o ensino de
Jesus, o que na maior parte do tempo não é verdade. Há inclusive neste bolo,
alguns que são considerados como cristãos, que sequer acreditam na existência de
um cristo. Pasme! E ainda tem aqueles insanos que tem uma reencarnação
particular do cristo.
Dentro do mundo chamado
evangélico existem centenas de aglomerados: Assembleianos, Batistas,
Presbiterianos, Congregacionais, Metodistas, IURD, Mundial, Graça, Nova vida,
Vida Nova, Maranata, Cristã.. e outros. Cada um com uma linguagem própria.
Dificilmente existe diálogo entre eles. Assim, há alguns grupos que lançam
candidatos próprios, levando os seus fiéis a votarem neles. Os grupos
considerados tradicionais, que tem forma de governo democrática, em geral, não
praticam uma política aberta, não elegem candidato algum. A política é apenas
interna. Nos grupos pentecostais e neopentecostais, cuja forma de governo
episcopal, que concentra o poder nas mãos de uma só pessoa, como líder vitalício da
instituição, há uma vontade para se eleger os seus representantes
junto ao governo. Como eu disse antes, não vejo nada ilegal aqui, apenas imoral
e eticamente incorreto.
Há muita hipocrisia naqueles que
se denominam cristãos, e se mostram como paladinos na luta a favor da moral e
da família. Sabiamente certa pessoa de esquerda manifestou-se afirmando:
político cristão que defende a família não deveria ter amante. Esta doeu viu?
Quer dizer, doeu aos meus ouvidos, porque o destinatário desta fala, nem se
coçou.
Portanto, falar de cristão e
política é uma das coisas mais difíceis de fazer. Quem está de fora pensa que
entende alguma coisa, e então fala muita besteira. Não vejo como o STE irá
julgar algo tão difícil de ser julgado, uma vez que a discussão não tem nada de
simples.
Sergio Rosa
[i] http://agenciabrasil.ebc.com.br/justica/noticia/2018-08/tse-abre-debate-sobre-proibicao-de-campanha-em-templos-religiosos